Um depoimento feito por uma jovem universitária sobre a vida no Brasil. Leia até o fim.
Quando uma parte do coração de uma letã fica no Brasil.
Sim, o inacreditável aconteceu – eu, uma “menina normal” cheguei em Curitiba para, em duas semanas, desfrutar o máximo possível de uma das grandes cidades do Brasil. Maravilhas e bênçãos me acompanharam naquelas duas semanas e só posso estar agradecida por tudo ter sido tão maravilhoso como foi.
A minha família brasileira… Sim, eu tenho uma família em Curitiba e ela será para sempre. Estas maravilhosas pessoas já começaram a fazer falta naquele momento que eu embarquei no avião para vir embora quando lágrimas tristes de despedida não paravam de rolar. Até agora as vezes fico triste sabendo que eles estão longe, longe, tão distantes. Mas estou muito, muito agradecida e eu os amo muito.
Bem, a minha chegada foi tarde da noite, senão eu teria me desapontado que o sol não mata ninguém e que as pessoas não estavam vestidas com roupas brilhantes e coloridas como eu tinha imaginado. Mas ao amanhecer fui a primeira a levantar… os pássaros cantavam tão alto! Sai na varanda para ver se por acaso não estivesse havendo alguma briga entre eles, mas nas manhãs seguintes acostumei com o linguajar dos pássaros e a sensação de verão.
As minhas papilas gustativas recordam destas duas semanas com grande alegria. A mesa sempre estava repleta de comida. Do meu ponto de vista, perspectiva leta, ficava preocupada e até triste pela quantidade de comida que sobrava na mesa. Somente nos últimos dias da última semana eu terminava de jantar não ligando para a consciência que me acusava de não esvaziar totalmente o prato. Tem uma questão que me incomoda – onde fica a grande quantidade de comida que sobra nos restaurantes? Qual a fruta do Brasil? São muitas variedades de frutas e muitas variedades de pratos. Muitos mesmo, e de verdade muitos! A preocupação que tinha com o meu peso aconteceu inteiramente ao contrário. Eu acredito ser devido ao sol forte. O que sempre me faltava era a “limonada suíça” da qual aprendi a receita e eu mesmo preparava. E como diz um meu bom amigo, isto é água com açúcar… e felicidade. Para ele pode ser, mas nas minhas lembranças surgem os dias de sol, o Brasil, as praias e a felicidade.
Depois dos três primeiros dias senti falta de andar a pé. As pessoas em Curitiba movem-se motorizadas, mas para mim aqui onde moro em Riga é muito mais fácil e rápido tomar os atalhos onde se caminha a pé. Estes caminhos alternativos parecem não existir ai! Pode ser que a gente deva entender a razão: fora de casa é muito calor, e para uma letã, insuportável. O tempo todo você está no sol.
Quando tinha que atravessar uma rua eu corria com a esperança de não ser atropelada. Em Curitiba como entendi em todo Brasil existe uma lei que quando o sinal abre para o pedestre, vá! Voltando a Letônia vi que aqui haveria grande dificuldade de visualizar os semáforos que estão pendurados em locais possíveis e impossíveis de serem visualizados.
Também não cheguei a compreender quais as pessoas devo beijar a face e quais não. Parece que gostam e ainda outras depois disso vem um abraço apertado. A minha lógica era cumprimentar as pessoas conforme o costume local, mas o que fazer com a vendedora na loja. Beijar? E um paciente no hospital, beijar ou não? Mas parece que o verdadeiro sentimento destes cumprimentos possam ser sentidos só pelos próprios brasileiros e era bom que eles percebiam que eu era estrangeira. Mas assim mesmo havia ocasiões que eu ficava numa sensação confusa, não sabendo se devia beijar ou não. Então nestas duas semanas aprendi beijar pessoas estranhas e não tão estranhas.
Mas ir um baile ao estilo brasileiro eu não esperava. E foi uma imensa alegria que pude ir a dois bailes. Meus olhos brilhavam admirando as centelhas e luzes variadas. Como eram os vestidos de baile. E parece que ninguém se envergonhava por ter vestes amplas e outras pelo contrário muito simples e pequenas. Outra coisa que não interessa é a sua altura. As pessoas se encontram no baile para se alegrar, sorrir e dançar. Se o jovem diz “eu não sei dançar, mas vou tentar” significa que ele não mexe os quadris como Enrique Iglesias, mas conhece o ritmo muito bem e conduz a sua garota com perfeição. Quase o tempo todo a música toca com ritmos brasileiros e as pessoas instintivamente começam a dançar. Não sei qual o compasso da dança, mas dois passos à direita e dois passos à esquerda. Aqui na Latvija aprendemos modos e passos especiais para encaixar com o ritmo, etc, mas no baile no Brasil o rapaz convida a menina para dançar e tudo acontece maravilhosamente.
Parece que foi no primeiro dia que cada palmeira sorria e cada casa latino-americana sorria. Aquilo parecia irreal, e de vez em quando eu tinha que me convencer que eu estava no Brasil – sim, eu estava no Brasil! Houve momentos que tinha medo que fosse um sonho e eu acordasse.
Dois meses já se passaram desde que deixei o Brasil. É inacreditável, mas as lembranças estão tão profundamente gravadas que cada vez que o sol brilha forte aqui na Letônia eu fecho os olhos e imagino que estou de volta no Brasil brilhante. Como deixei parte do meu coração no Brasil, a minha alegria que todo tempo me aquece é o sol do Brasil e o sorriso das pessoas.
Fevereiro de 2015.
COMPLEMENTO:
Como Liene veio parar no Brasil?
por Carlos Ademar Purim
Ao final de 2013, Andreis nosso filho mais novo passou no exame de seleção do curso técnico da UTFPR, um exame muito concorrido com cerca de 20 candidatos por vaga. Quando no início de 2014 ele foi fazer a matrícula todo entusiasmado para começar o ano letivo, pensando que as aulas começariam em Fevereiro ou, no máximo, em Março, ficou sabendo que, em decorrência de uma greve no ano anterior, as aulas só começariam no dia 9 de Abril.
Para não ficar todo este período em casa (jogando no computador), e como prêmio pela dedicação na vitória nos exames, me veio a ideia de enviá-lo para um mini-intercâmbio na Letônia – terra dos meus avós paternos. Nossas duas filhas já tinham feito programas de intercâmbio fora do país – Laila nos EUA e a Mirela na Inglaterra.
O problema era fazer os preparativos num curto espaço de tempo, especialmente arranjar uma família que o recebesse, uma vez que nossa família não tem mais parentes por lá.
O primeiro nome que me veio à mente para pedir ajuda foi o do Pr. Hans Berzins, que trabalha como missionário brasileiro na Letônia. Na ocasião ele estava no Brasil e, obviamente não poderia hospedá-lo. Também não via nas famílias da sua igreja nenhuma com perfil de recebê-lo. Mas lembrou que sua filha Raissa, estudante de Medicina na Universidade de Riga, tinha uma colega, cuja família era habituada a receber intercambistas. Conversando com esta colega, Raissa obteve o sinal positivo que seria possível, sim. Essa amiga chamava-se Liene Muceniece. Seus pais, Andris e Bênita e mais sua irmã Zane, além de receber intercambistas, fazem um trabalho extraordinário de cuidar temporariamente de crianças em risco, até que as autoridades encontrem famílias que os adotem definitivamente.
Feitos os primeiros contatos com a Liene, a única da família que falava inglês, conseguimos marcar a data da viagem e fazer os preparativos necessários.
Aquelas seis semanas que o Andreis ficou na Letônia foram marcantes em sua vida e que daria um relato a parte. Mas o que importa neste texto, é destacar a gentileza desta família em acolhê-lo e proporcionar esta experiência ímpar. Depois do seu retorno, ainda mantemos contatos frequentes através dos meios eletrônicos, e em uma das conversas surgiu a possibilidade de ela vir ao Brasil participar de um mini-estágio no Hospital de Olhos – especialidade que ela tem como objetivo. Minha esposa, Kátia Sheylla, como médica do Hospital de Clínicas e professora do Curso de Medicina da Universidade Positivo viabilizou este estágio pela amizade com uma das sócias daquele hospital. Para Liene foram meses de muita economia para a aquisição das passagens aéreas.
Finalizando este complemento, como família damos graças a Deus pela oportunidade deste intercâmbio. À família de Liene Muceniece nossa gratidão pelo coração hospitaleiro e amoroso.