Os boatos vindos do Rio | Carlos Leimann a Reynaldo Purim

[Cartão postal em português, apresentado na grafia original]

Cachoeiro do Itapemirim, 27/10/18

Prezado Reynaldo! Saudações!

Os boatos por aqui, vindos do Rio, são de atemorizar o mundo. O que há de realidade ahi? A “Hespanhola” já chegou até o Collegio? Está funcionando ainda? Nós fechamos o Collegio ainda que sem motivos de força maior, pois aqui a “tal” não inspira medo, porem o povo está alarmado e é o peior. Qual é o teu destino pelas ferias? Já resolveu? Estou propondo um negocio ao Sr. Reno [NOTA: Loreen Reno, missionário norte-americano naquela região] – Se ele aceitar…? Não sei – porem quero saber alguma cousa de ti — direta e francamente. Escreva de modo expansivo. Seu como sempre,

Carlos Leimann

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A gripe de 1918

Se você viesse para casa | Arthur Purim a Reynaldo Purim

Rio Novo, 24-10-1918

Querido irmãozinho,

Rio de Janeiro

Primeiramente aceite os meus cumprimentos! — Já faz tempo que não mais tenho escrito, mas hoje vou escrever um pouco. Eu estou passando bem. Hoje o tempo está ótimo, mas passou um grande período chuvoso. Não conseguimos queimar as coivaras e já há bastante verde brotando nas derrubadas. Se tudo der certo, vamos queimar a grande coivara da mata virgem na semana que vem. Fique lá atento para o espoucar das taquaras e a grande fumaça, quem sabe com um pouco de esforço você consiga avistar…

Na semana passada começamos a capinar as roças na Bukovina; as de perto de casa já tínhamos terminado. Ontem fomos plantar batata inglesa na Bukovina. No ano passado deu batata muito boa lá, e desta vez plantamos mais. No ano passado plantamos 1 quarta e colhemos 14 quartas. Algumas semanas atrás levei o meu [porco] “Nerpukli” para a cidade e rendeu 4 arrobas. Agora estou muito rico e em dinheiro rendeu 42$000. Se você viesse para casa eu poderia te emprestar. Você terá que vir para casa, pois o “Traginim”, filho da Marsa, já está bem crescido e você terá que domá-lo para que possamos montar. Você lá tem algum lugar onde possa andar a cavalo? Bem hoje chega. Aguardo uma longa carta sua. Com muitas carinhosas lembranças,

Arthurs [Otto Roberto Purim, aqui com cerca de 13 anos de idade]

PS. Se puderes, venha para casa.

Viagem a Tubarão | Olga Purim a Reynaldo Purim

Escripto em letto
[observação em português no original]

Rio Novo, 24 de outubro de 1918

Querido Reinold,

Recebi a tua carta, escrita no dia 3 de outubro em brasileiro em nome de E. Leimann, no dia 18 de outubro. Agradeço. Eu devia responder mais rápido, mas o tempo chuvoso e as estradas lamacentas não permitiram. Devido a isso a matança dos porcos gordos [também] não foi possível; como poderíamos transportar os mesmos para vender? Por isso não respondi, já que ninguém iria levá-la ao correio.

As tuas cartas também estão demorando. Recebemos os jornais e uma pequena cartinha e mais o Bolletin cor de rosa. A carta do Watson também foi recebida. E quanto à convocação e os regulamentos militares, não gostamos nada, principalmente quando [soubemos que] você poderá ser chamado. Aqui sobre estas coisas pouco se fala.

Quanto ao nosso bem-estar, graças a Deus estamos muito bem. Serviço é que temos bastante: temos que capinar e plantar, e quando a gente termina num lado, o mato já está nascendo do outro.

Agora faz um mês que está quente, chuvoso e úmido que até parece janeiro ou fevereiro. São chuvas de trovoadas, mas temos medo que venha algum período de seca. Milho já plantamos cinco quartas, perto da roça da ponte; na roça atrás do mato plantamos arroz, mandioca, aipim grande, batata inglesa e amendoim.

Quanto às coivaras, ninguém consegue “fumegar”, pois estão ficando verdes e bonitas outra vez e quase não se distingue o que é uma coivara de mato por aí. Este ano tivemos visitas da Argentina [gafanhotos]; aqui em nosso terreno poucos tem aparecido, mas lá nos Klavin e nos Leimann passaram imensas nuvens. Por sorte não desceram, foram pousar bem longe na terra dos italianos, onde estão pondo ovos.

Aproveitando, enquanto me lembro, o Arthur Leimann manda muitas lembranças para você e para os seus colegas.

Agora vou escrever alguma coisa de novo: nossa viagem a Tubarão.

Tu tens viajado de trem muitas vezes, agora eu, desta vez foi a primeira — mas “quem toma gosto por viagens voltará a viajar”. Aqui o governo ofereceu passagem para as pessoas que quisessem votar para intendente; teriam que ir a Tubarão preparar uns papéis [de qualificação eleitoral], pois naquela primeira eleição não deu nada e por isso estavam procurando novos eleitores — dando passagem gratuita, refeições, pagamento do hotel, e tudo faziam para que fossem até lá. Mas havia uma condição: só podia votar quem tinha propriedade. Então Papai foi e aproveitei para ir junto, mas não comece a pensar que fui para votar também.

Nós pensávamos de aproveitar a viagem para lá comprar alguma coisa mais barato, mas não encontramos nada mais barato que em Orleans. Para não dizer que nada era mais barato, tinha o café, que em Orleans era 2$000 o quilo e lá era 1$500.

Nossa viagem foi no dia 26 de setembro. Fomos a pé na véspera até Orleans; eu pernoitei na casa dos Stekert e Papai foi para a casa do João Feldmann. Naquela viagem éramos seis letos: os Leimanns, o Arnoldo Klavin e o Willis Elbert. Pela manhã o tempo estava magnífico, mas mais tarde começou a ficar nublado e a soprar um vento frio e terminou ficando um dia até bem escuro.

Em Tubarão nada de bonito cheguei a ver, e sim estava cheia daqueles árabes velhacos. Comprar em Orleans é muito mais tranqüilo, pois os donos das vendas são todos conhecidos e são muito mais confiáveis.

À noite estávamos de volta e a Luzija foi me buscar com a “Marsa”. Papai não voltou naquele dia; a noite estava por demais escura e depois ainda começou a chuviscar. Voltamos todos montados de Orleans: eu a Luzija, os Klavin e os Leimann. Chegamos bem em casa, apesar da negra escuridão, que podia até furar os olhos. Ainda não sabemos quem será o novo intendente.

No dia 15 faleceu o velho Wilmans e no dia 16 foi feito o funeral. Ele toda vida morou em Mãe Luzia, mas quando doente, sem mais poder se cuidar e nada mais poder fazer, voltou a morar com a mulher em Rio Novo.

Na noite de 16 de outubro teve a festa de aniversário da União de Mocidade da Igreja de Rio Novo. Como foi a festa eu não sei, as estradas estavam lamacentas, tanto que quando as pessoas passavam fazia barulho. Foi servido café com mistura e isso custou $300 por pessoa.

No dia 9 de outubro foi a festa do Jubileu de 25 anos da Igreja Batista de Mãe Luzia e para tanto foi convidada a nossa igreja e também a do Rio Novo. Da nossa igreja foram o Robert Klavin e do Rio Novo uns quatro. Como foi o Jubileu não sei ao certo, mas é possível que o Roberto te escreva contando.

Na quarta feira passada, dia 24 de outubro, foi o casamento do Jahnis Frischembruder com a Laura Seeberg. O casamento foi memorável, como bem merece uma filha única. Mas a Laura “não tinha alimentado o cachorro nem o gato”: o tempo já estava chuvoso, mas nem no dia anterior nem no dia depois choveu tanto como naquele dia. Deste a alta manhã roncava trovoada, relampejava e caía água.

Todos os moradores da localidade foram convidados, menos nós. De Orleans foi convidada a banda de música, bem como outras pessoas importantes que não vieram ou não puderam vir. A solenidade na igreja foi às 12 horas, e depois todo cortejo subiu o morro em direção a casa dos Seeberg. Lá houve a maior comilança e beberança da paróquia, e não sei quantos centos foram gastos na festa do casamento, pois tudo devia brilhar e reluzir. Além disso, em toda a colônia nenhuma moça teve um enxoval tão completo e tão grande como o dela — teriam sido gastos milhares de réis.

Tempos atrás o Victor Karklin esteve interessado em se candidatar a “genro”, mas não se apressou o suficiente e o outro passou ele para trás. E por isso também não foi à festa. Os Karklin teriam dito que se soubessem de tanta riqueza no dote, teriam se apressado mais; também eles só procuram as riquezas e estas não são muitas.

A segunda festa do casamento foi no domingo na casa nova, defronte aos Frischembruder, recém-construída no outro lado rio, onde era a antiga colônia dos Match. Esta casa foi construída de tijolos e seria a melhor de toda colônia, especial para o Jahnis.

Há pouco tempo houve noivado da Ana Burmeister com o Alfredo Leepkaln. Quem não gostou foi a senhora Wilman, pois parece que queria o moço para a seu genro e viu a sua filha ser preterida. A “distinta” pôs a boca no trombone e depois chegou a conclusão que não perdeu tanto, pois esse moço Leepkaln não é muito afeito ao trabalho.

Pode ser que em breve o Arnold Karklin e o Augusto Felberg viajem para São Paulo. O Jurka tem escrito que lá em Nova Odessa que qualquer um ganha 2$000 por dia e assim eles também iriam para Leijputriju [NOTA: Pronuncia-se “Leiputriu” e é um lugar fabuloso e imaginário onde mana o leite e o mel, equivalente a Shangrilá ou El Dorado]. O Matiss, que também está lá, escreve que lá tudo é caro. O que adianta ser tudo tão caro, se nada se tem para vender?

Bem hoje chega, outra vez escrevo mais. Muitas lembranças de todos. Fico aguardando longa carta sua.

Olga

PS [Escrito à lápis]. Junto estou enviando 100$000. Recebemos a carta escrita em 7 de outubro e também os jornais. Se puderes venha para casa, mas se tem lugar onde ficar decida você mesmo o que quer. Orleans, 01 de novembro de 1918.

Como capinar | Olga Purim a Reynaldo Purim

[Cartão postal]

Orleans, 9 de outubro de 1918

Querido Reini,

Hoje, agora mesmo, recebi os jornais e a carta escrita dia 14-9-18. Obrigada. Aquela carta registrada recebi já faz tempo e já mandei uma resposta. A carta do Watson, depois de duas semanas. Ele escreve sobre os regulamentos do exército em tempo de guerra, e isso nós não alegrou nada. Então, quanto a isso faça o que achar melhor. E quanto às férias, você poderá ir a algum lugar? Ou vai ter que ficar todo o tempo estudando? Nos estamos bem com saúde; o tempo na maior parte está chuvoso e não permite ir para a roça. Serviço, temos bastante, como capinar, plantar, etc. Mais nada importante por aqui tem acontecido. Com muitas lembranças de todos de casa,

Olga

Uma pequena povoação | Ludvig Rose a Reynaldo Purim

[Cartão postal em português, na grafia original]

Sto. Amaro, 05. 10. 18

Meu querido Reynaldo!

As pressas! Recebi a tua carta de 1. do corrente, hontem. Estou, há algum tempo, morando em Sto. Amaro, uma pequena povoação nas proximidades de São Paulo, e passo regularmente ocupando-me com trabalho rural. A minha saúde, como a de minha família, nunca foi melhor.

Se tens vontade — e creio que não há motivos de admittir o contrario — de pegar na enchada e plantar as batatas, então estás convidado de passar as tuas férias em minha casa.

O meu endereço [de correspondência] continua a ser o mesmo: Rua Libero Badaró, 99.

Cumprimentos cordiais de todos nós.

Lrose [Ludvig Rose]

Não vens assistir a Convenção? | Carlos Leimann a Reynaldo Purim

[Cartão postal em português, na grafia original]

Cachoeiro do Itapemirim, 2 – 10 -18

Querido Reynold, saudações. Recebi o teu postal, se já não respondi é por absoluta falta de tempo — vivo em carreira contínua — no Collegio temos 85 alunnos e ensino 6 em aulas particulares. E muitas viagens evangelisticas e outros trabalhos fazem-me cabelos brancos. Não vens assistir a Convenção Nacional? Estou pesquisando se posso achar lugar para si durante as ferias.

Com amor fraternal,

Carlos Leimann