ERNESTO GRÜNTALL – RECORDAÇÕES DE JOÃO REINALDO PURIN
Ernesto Grüntall era uma “figura” solitária que morava ao norte de nossa propriedade na colônia dos letos de Rio Novo e adjacências.
A nossa casa ficava numa subida que era conhecida como “o morro dos Purim”. A estrada ao chegar em cima do morro se dividia.
O local era conhecido como “encruzo” ou “encruzilhada”. À direita ia-se para Rio Carlota e à esquerda ia-se para Brusque do Sul. [ Neste ponto as pessoas que vinham da Igreja as vezes ficam bastante tempo conversando antes de separar-se e antigamente este lugar era chamado de “Kanels” porque havia um tronco imenso desta árvore]
Caminhando-se uns 100 metros para a esquerda, pela estrada cheia de pedras ferro pontiagudas, chegava-se à entrada da casa do Ernesto Grüntall. Havia uma porteira e mais para dentro uma casa de tijolos à vista. Era tudo muito simples, uma vez que não tinha a menor preocupação com coisa alguma. Estava sempre lendo alguma revista ou jornal antigo.
Mais aos fundos havia uma olaria que nunca a vi funcionando.
Mais adiante ainda ele fazia algumas plantações que não davam para a sua subsistência. Apesar de serem terras planas e uma grande área para cultivo.
Passados alguns tempos apareceu em sua propriedade e mais tarde veio morar na mesma casa uma senhora conhecida como Maria Bombazara que nós a chamávamos de “Velha Marica”. Usava óculos redondos, cabelos oxigenados e crespos artificialmente. Lembro-me que vi, perto do fogão, pela primeira vez uma espécie de tesoura ou tenaz que era aquecido no fogo para aquela finalidade. A “Velha Marica” era bem ranzinza. Criava problemas com todos os vizinhos; inclusive com meus pais, nunca soube o por quê. Parece também que mexia com algum tipo de magia.
Pois bem, o Ernesto Grüntall era de um físico frágil, como se pode ver na foto de n.289. Tinha um andar lépido. Freqüentemente aparecia em nossa casa para conversar com a vovó Lizette e com papai e os demais. Conversava bastante com o Valfredo que poderá também relatar outras recordações. Era pacífico e muito bom de conversa, sempre querendo saber das novidades. Não me lembro de tê-lo visto nervoso ou criando problemas com quem quer que seja.
Lembro-me de que nos tempos da 2ª Grande Guerra, ao receber uma carta, creio que tenha sido a última de sua namorada que se chamava Toska que morava na Alemanha; veio feliz nos mostra e lia alguns trechos que falavam de uma tal de “schlakfeast” que se referia ao carnear porco cevado.
Também trazia jornais da Alemanha com um suplemento infantil em Alemão “ KunterBunt” que nós ficávamos vendo as figuras. Ele era grande admirador do Führrer Adolf Hitler.
Outra lembrança que tenho do Ernestinho como era conhecido, foi quando, certa vez, ao voltar da cidade de Orleans, entrou em nossa casa e contou maravilhado que viu uma “máquina de moer dinheiro”. Era naturalmente a máquina registradora que ao se rodar a manivela, a gaveta se abria para dar o troco.
Outra vez, não sei como a conversa girou em torno de dentes. Ele, então disse que não queria mais dentes, pois assim toda comida ia direto para o estômago… Meu pai, como sempre, por tudo isso achava muito engraçado e ria muito. Pois o Ernestinho sempre dava a tudo um ar filosófico.
Pouquíssimas vezes aparecia na Igreja Batista Leta de Rio Novo bem como em outros eventos da comunidade leta, tais como piqueniques etc. Como já foi dito, era asceta, ou niilista, ou ateu ou coisa que o valha.
Saí de Rio Novo, em fevereiro de 1954. Passados alguns tempos, soube que o velho Ernestinho havia falecido e que tinha sido sepultado no cemitério da Igreja Batista de Rio Novo. O nosso pai é quem dirigiu o serviço do funeral. Não sei o que ele teria dito nessa ocasião a respeito dele. Realmente ele foi uma “figura” ímpar. Um bom vizinho.