Tradução da última carta escrita por Olga Purim para Reynaldo Purim – 1926 –

[Última carta escrita pela Olga numa data muito próxima ao seu falecimento]

Rio Novo 11 de junho de 1926
Querido Reini:
Saudações!!
A tua carta recebi na última sexta-feira e hoje já estou começando a escrever a resposta e talvez ache que seja rápido demais. Pela carta muito obrigada!
Se bem que esta carta realmente não me deixou satisfeita, mas você pouco vai se importar por que eu não gostei que você fosse embora para a América e a sensação que eu tenho que nunca mais vais voltar e eu nunca mais vou te ver por que lá e realmente muito distante.
Isto aconteceu um dia antes do recebimento das cartas. A Lúcia esteve com o Augusto Klavim pedindo que trouxesse a correspondência, pois nesta semana ninguém de nós foi à cidade. Naquela noite eu sonhei que tu tinhas chegado e trazido muitas coisas [“Mántinhas” Difícil tradução, pois “Mant” quer dizer riqueza, mercadoria, então como está no diminutivo poderia ser traduzido como” Coisinhas ricas”] lindas e disse que tão logo não iria embora. No sonho nós andávamos pelas roças lá perto da mata no alto do morro e eu ainda era forte e podia andar tão rápido como quando você ainda morava aqui e tudo era tão maravilhoso. De manhã quando acordei pensei e tinha certeza que o Augge iria trazer cartas suas e como realmente trouxe, mas com notícias todas ao contrário do que eu estava esperando, pois você quer ir para mais longe ainda. Eu e o Arthur tivemos combinando escrever para que agora que já os estudos estão terminados, você poderia tirar neste inverno umas férias mais prolongadas ou uma licença de 5 ou 6 meses para tornar a viver um pouco entre nós e é possível que os filhos do Leiman venham passar uns tempos entre nós. O Fritz escreveu que quer vender o terreno lá do Rodeio do Assucar. A Lúcia já te escreveu, mas parece que está foi extraviada. Se você tiver bastante dinheiro poderá vir aqui para comprar. Se o Arthur tivesse dinheiro ele compraria, pois ele gosta muito mais de lá do que aqui. Ele não pensa de estudar na América. Eu também gosto mais de lá, pois lá é bem melhor que aqui em Rio Novo, pois a topografia não é tão montanhosa, bastantes terras aráveis, a mandioca se desenvolve muito nos dois anos com raízes duas vezes maiores que aquelas aqui do Rio Novo e quando a farinha tem preço é muito mais fácil de fazer a farinha do que cultivar e colher feijão que é um trabalho muito mais penoso e também a mandioca pode ser usada para engorda de porcos economizando milho e assim não há tanta necessidade de plantar tanto milho. Eu de lá também gosto é do pasto. Nós agora necessitamos muito de pastagens, pois temos 20 animais entre bois e vacas e mais 8 cavalos entre os grandes e pequenos. Também lá não tem aquele maldito “matbaste” [“Matbaste” é a pronúncia e escrita incorreta de “Mata-pasto” a popular guanxuma] que infesta as pastagens aqui do Rio Novo. A renda proporcionada pelas vacas no verão é compensadora. O quilo da manteiga foi a 4 mil e se o Leiman vender o terreno para outros então nós também teremos vender as vacas por que aqui no Rio Novo não teríamos espaço no e qualidade da grama no pasto apesar do “matbaste” ter sido cortado com alfanje, mas a terra aqui é mais seca e então teremos plantar grama em outras áreas e capinar seguidamente senão o mato toma conta de tudo e a grama não sobrevive. O Arthur sugere que você venda o terreno da Bukuvina e compre lá o terreno dos Leimann. Lá não tem as tremendas grotas da Bukuvina que fizeram abalar inteiramente a minha saúde. Os Italianos correm como loucos atrás de terrenos com mata e capoeiras para comprar, mas não sei se algum deles vai levar.

A novidade é que nós logo vamos ter um vizinho novo, pois o Butler vai vender o terreno dele para o Attis [Otto Slengmann]. Ele tem terreno e mora no Rio Larangera, mas está muito deslocado em relação à comunidade leta. Então ele vai vender lá e comprar junto, pertinho da própria Igreja. Eu vou te escrever contando tudo depois dele mudar.

Agora eu vou ter que dar uma bronca. Você mesmo não poderia tirar um tempo, uma semana só para visitar os nossos parentes de São Paulo. O Paps faz tempo que pediu para pressionar você. Se nós tivéssemos condições então já há tempo alguém de nós teríamos ido visitá-los. Nós somos tão poucos e ainda por cima se eu não estivesse tão doente então a Lúcia teria ido. Mas para você é realmente muito mais fácil. Numa semana sem avisar ninguém chegar lá e ver como vivem por lá. Sempre achei que eles não estivessem passando muito bem e terem que trabalhar muito. E também a alimentação deve ser muito difícil. Nós aqui a carne, o leite e os adoçantes (Açúcar e mel) nunca a gente consegue gastar tudo, mas lá tudo é tão caro. O Willis Ochs quando mudou para lá levou banha e carne e quando estes terminaram ele gastou um dia inteiro a procura de banha e não encontrou. Depois conseguiu um quilo de toucinho e por ele teve que pagar 8$000. E como comer então?

Agora alguma coisa sobre a minha enfermidade. Quando escrevi outra vez, eu estava em Orleans tomando injeções. Mas não aquelas que você mandou, pois o farmacêutico disse que aquelas não serviriam e que ficaria pior, mas umas outras que ele receitou. Então comprei uma dúzia e ele aplicou, mas não adiantou nada e ainda fiquei pior. Então depois o Stroberg também precisou aplicar umas injeções e o malandro do farmacêutico também disse que aquelas trazidas por ele de Varpa não serviriam. Mas ele enfrentou com braço forte e sangue nas veias; então ele aceitou aplicar as injeções prescritas pelo pessoal de São Paulo e que serviram em outras ocasiões e agora foram válidas outra vez. O farmacêutico ficou envergonhado, depois da melhora do Stroberg.. Agora não tenho forças para ir, a Orleans e estou me tratando com água [Hidroterapia] e chás. Estive consultando o doutor que vem todas as semanas das Minas [Lauro Müller] para Orleans e ele falou que o meu mal é de água [Não sei o vem ser mal da água – Será Hidropisia?] e o sangue envenenado [Asinis sagifetas] e com a circulação em contrário. Queria que fosse lá para as Minas para retirar a água com uma bomba e morar lá no hospital onde receitaria a medicação e onde ele diariamente poderia acompanhar e senão fosse procurar um hospital em outro lugar, idéias que realmente não me agradaram. A Mama trouxe do Zeeberg um livro em alemão com ilustrações onde existem figuras associando o problema do coração com o mal da água, mas bem certo o meu problema não aparece descrito nos desenhos. Comer, eu gosto de comer, mas não todas coisas que antes eu gostava. Dormir antes eu dormia bem, mas agora quando eu deito começa uma tosse então o sono não vem. O peito e o esôfago [Pakrutis] estão inchados e sensíveis e quando tento andar rapidamente, fico exausta e dá uma grave falta de ar. Forças não tenho nenhuma, somente posso ficar sentada então somente consigo tricotar ou costurar e o mais difícil é que eu sinto um frio terrível. Principalmente nas mãos e nos pés que já estão doentes. Quando está frio os lábios ficam roxos e pelas manhãs os olhos e a face amanhecem inchados e às vezes a cabeça dói um pouco. Também não suo. Nem no pleno verão quando os outros estão completamente suados eu sinto calor, mas não suo. Também no tratamento quando tenho me envolver em um lençol quente e ficar inteiramente coberta o suor não aparece. Estou escrevendo isto tudo, pois poderás ter um conselho e poderias fazer o favor de escrever. Quando às vezes eu penso que antes eu podia andar e trabalhar parece um sonho distante e impossível que nunca aconteceu.
Bem agora chega de escrever. Você sempre escreve cartas curtas. Esta saiu uma longa carta.. A Lúcia já começou e é provável que já tenha terminado. O Arthur na vez passada escreveu, mas agora ele diz que não tem tempo para escrever, pois ele está comprometido com a fabricação da farinha de mandioca. Você escreve que lá está tudo caro e aqui está tudo muito barato. A Farinha a 5$000, o toucinho a 15$ – 16$000 a @, mas aquelas coisas que a gente tem que comprar nunca podem estar baratas.—
Agora vou esperar uma longa carta sua. Escreva quem vai pagar a tua passagem e quando vais viajar e se terás o dinheiro suficiente. Onde você vai guardar as tuas coisas ou vai levar tudo junto?
Aqui o tempo está frio, mas as grandes geadas ainda não chegaram, mas vai esfriar demais, pois, sopra um vento gelado.
No domingo passado houve o funeral do Reinold, criança de 6 meses filho do João Leepkaln..
Ainda muitas e amáveis lembranças da Olga.

Depoimento de J. A. Zanerip | Manas atminas no Rio Novas laiku dzivi

Terceira Parte

MEMÓRIAS DE MINHA VIDA EM RIO NOVO

Agora na nova vida em Rio Laranjeiras. Gostei muito da troca do Rio Mãe Luzia pelo Rio Laranjeiras. O rio Mãe Luzia era um rio largo e profundo. O rio Laranjeiras era raso e suas águas cristalinas e bem aquecidas, porque corria longos trechos entre pedras bem lavadas por grandes enchentes.

Agora há poucos anos viajei de Tubarão a Lauro Müller para subir aquela serra (Rio do Rastro). Ao passar por Orleans subimos até o lugar onde vivi na minha adolescência, isto é, nas margens do Rio Laranjeiras. Fiquei pasmado vendo o meu bem lembrado rio Laranjeiras, sempre cheio de muita água, agora virado num pequeno córrego! Isto talvez porque naqueles tempos chovia mais e as raízes da mata virgem retinham o escoamento rápido, conservando assim o rio sempre com bastante água.

No meu tempo esse rio era um paraíso da criançada. Era muito piscoso. Passei muitos dias pescando e me divertindo com os colegas. Será que este mundinho está secando mesmo?

A minha infância não foi nada fácil, pois já desde pequeno ia junto com a mamãe ajudar a limpar as roças; quando chegou o tempo de ir a escola as condições não permitiam ir. Minhas irmãs, sendo meninas, iam à escola, e à noite eu tinha que aprender — isto é, estudar as lições que as irmãs tinham aprendido na escola.

Mais tarde, quando fui à escola, meu primeiro professor foi o Sr. Treimanis, mas com a saída deste professor houve um longo período sem aulas.

As idas para a escola às vezes eram terríveis, principalmente no inverno. A estrada ficava branca de geada e a gente não tinha dinheiro para comprar sapatos, assim tinha que enfrentar a estrada com o pé no chão mesmo. Haviam ocasiões em que nem sapatos poderiam ser utilizados, com a grossa camada de lama que era formada pelas rodas dos carros de boi — principalmente quando chovia muito, — agravada pela passagem das tropas de burros e mulas que levavam mantimentos para os habitantes da serra. Essa conjunção de fatores tornava as precárias estradas intransitáveis.

Quem realmente poderia gostar dessa lamaceira eram os porcos que eram trazidos em manadas daquelas imensas distâncias, isto é mais de cinquenta quilômetros — de além das montanhas da serra, onde se situavam os grandes pinheirais e onde eram criados, tendo depois ainda a descida dos contrafortes da serra quase a pique. Hoje pode parecer inacreditável. Mas nós, que vimos com os próprios olhos, esperamos que aceitem essas coisas que hoje parecem totalmente improváveis ou impossíveis.

Tempos depois, agora já com uma irmã casada, um dia resolvemos fazer um mutirão para cortar cana de açúcar. Um futuro cunhado meu foi também. Voltando para casa o tempo fechou e começou a garoar, e a escuridão se tornou completa.

O Ernesto Karklis estava de namoro com a minha irmã Alvina, que tinha vindo a cavalo, mas para acompanhar o seu broto ele deu o cavalo para eu ir montado. Quando eu ia indo passando onde havia uma trilha por uma capoeira que naqueles dias tinha sido roçada e derrubada, e pela qual o cavalo estava acostumado a passar, o animal entrou derrubada adentro. Porém, como estava escuro demais e sem nenhum ponto de referência, fiquei sem saber como voltar. Resolvi esperar.

Quando ouvi vozes da turma conversando dei umas chicotadas no cavalo e voltei ao caminho. Apesar de não estar tão perto assim, a turma começou a gritar apavorada. Ao chegar a uma encruzilhada onde o Ernesto costumava se separar, fiquei esperando por eles. Quando a turma chegou, contaram que um bicho muito grande os tinha atacado, lá próximo ao toco da “maria mole” [NOTA: ombu, Phitolacca dioica, árvore chamada de “maria mole” por causa do tronco esponjoso e macio], e que tinham levado um tremendo susto. Logo imaginei quem deveria ter sido o bicho enorme: não poderia ser outro senão eu com o bandido do cavalo. Não contei nada com medo de apanhar, pois realmente não queria ter assustado ninguém.

Só bastante tempo depois, quando peguei uma vez carona no carro de boi do colega Adolfo Burmeister, e ao passar no famoso lugar dos bichos, no toco da “maria mole” com os seus lindos brotos, contei ao Adolfo que não acreditava nessa história de bichos e contei o que acontecera comigo e com aquele cavalo naquela noite.

O Adolfo começou a rir, não querendo acreditar e achando que era minha invenção, mas consegui convencê-lo de que era a pura verdade. Ai o Adolfo fez me prometer que não contaria nada a ninguém (e prometi) e contou-me outro fato sobre esse mesmo local.

Disse ele que uma vez tinha se atrasado na roça e já no crepúsculo da noite viu o Jacob Karklis vindo pelo caminho. Rapidamente ele, o Adolfo, saiu do caminho e entrou no meio da touceira de brotos do toco da “maria mole”. Quando o Jacob ia passando ele deu um ronco e saiu pulando abraçado aos brotos.

Pobre do Jacob! Jogou uma pedra que trazia na mão e correu como um doido, chegando em casa completamente exausto e contando que tinha acabado de escapar de um bicho terrível. Como conseqüência do susto adoeceu por um bom tempo.

Começou a circular o boato de que outras pessoas também tinham visto o bicho. Até um dia uma turma de italianos decidiu ajudar o pessoal na grande caçada ao lendário bicho. É claro que não acharam nada. Mas como esses caçadores podiam imaginar que esses bichos andam de carro de boi? Tudo mentira, fruto da fraqueza e do medo.

* * *

[continua…]

Origens da colônia: Breve história da Igreja Batista Leta do Rio Novo, última parte

continuação da segunda parte

Com preocupação também pelo bem-estar geral da comunidade, em relação à vida diária, foi organizada uma associação de moradores sob a orientação do pastor Inkis. Na realidade foram organizadas duas: o líder eleito para a associação do Rio Novo foi o J. Ochs, e para a do Rio Carlota o K. Seebergs. Como líder e dirigente das reuniões foi nomeado o F. Karps, e para secretário J. Frischembruder. Tudo foi feito com conhecimento e aquiescência do senhor Delegado de Policia de Orleans, Sr. Galdino Guedes.

A administração da associação de moradores tinha poderes para dirimir dúvidas e acertar pequenas desavenças entre os vizinhos — principalmente o que se relacionasse a cercas, porteiras, prejuízos causados pelo gado dos vizinhos em roças de outros, etc., — tendo inclusive autoridade para multar o culpado em Mlrs 5$000 (cinco mil réis), o que em moeda atual seria mais ou menos 20$000 réis. Precisamos anotar que essa multa nunca foi cobrada de ninguém.

A organização da associação de moradores aliviou o trabalho da igreja, pois toda e qualquer dúvida, queixa ou reclamação passou a ser tratada pelos responsáveis pela associação — pessoas vividas e com espírito cristão, que a partir desta postura tratavam todo e qualquer assunto. Nessas reuniões eram também discutidas novas idéias e o planejamento para melhorias na colônia.

A primeira e maior preocupação da comunidade era no sentido de se conseguir uma escola para a nova geração. Dirigiram-se então com uma petição à Empresa Colonizadora Grão-Pará, diretamente ao diretor Sr. Stawiarski, a fim conseguir um pedaço de terras para a comunidade — onde pudesse ser edificados a escola, o templo para a igreja e também o cemitério, — e terminaram conseguindo o terreno.

Em seguida a comunidade elegeu um comitê para a organização da escola, sendo Fritz Karps o dirigente e Juris Frischembruder secretário e tesoureiro. Os demais membros foram o compatriota e agrimensor J. Sarins, J. Ochs, M. Leepkalns, K. Matchs e K. Seebergs. Entusiasmados, os componentes da comunidade juntaram 411$000 réis para a viagem do futuro professor, que deveria vir da Letônia — mas que acabou demorando para vir.

Tendo em vista que a colônia de Rio Novo não tinha como crescer muito mais com a vinda de mais emigrantes da Letônia, já que todas as glebas das vizinhanças estavam tomadas, levando os letos que desejavam imigrar a procurar outras colônias (apesar de que nos vales vizinhos da colônia de Rio Novo ainda houvesse terras não desbravadas cobertas de matas virgens), o pastor Inkis organizou e também participou de expedições para busca e avaliação de novas áreas onde os letos pudessem ser assentados. Atravessaram o Rio Laranjeiras e o Rio Oratório, sobre cujas áreas não houve consenso quanto à viabilidade de aproveitamento. Na outra expedição, realizada nos fundos do Rio Carlota, nas proximidades da colônia italiana, foi encontrado um bom local, onde várias famílias letas se instalaram para morar, mantendo contato com Rio Novo.

Desenvolvendo o trabalho missionário, [o pastor Inkis] nos ensinava ainda hinos em língua alemã. Foram feitos vários cultos evangelísticos nesta língua, tanto em Rio Novo quanto em Orleans, resultando em conversões e filiação à igreja.

Foi também feita uma viagem festiva para a Colônia Leta de Mãe Luzia, que havia sido fundada na maioria por rionovenses. Desta viagem participaram mais ou menos vinte irmãos e irmãs dos coros, todos a cavalo, pois naquela época não havia outros recursos. A viagem durou dois dias e a noite foi passada ao relento, sob a luz das estrelas. Só noutro dia alcançou-se o objetivo da viagem, e também lá o trabalho missionário entre os alemães alcançou sucesso.

Quando a igreja de Rio Novo já se havia revigorado espiritualmente e o pequeno grupo que anteriormente se afastara já havia voltado, tendo sido recebido amorosamente pela igreja, pareceu ter chegado a hora de eleger biblicamente os seus servidores. Aos eleitos para o cargo de diáconos o pastor apresentou uma santa exortação:

— Agora vocês — disse ele — terão de se aproximar mais vezes da porta dos céus, em oração não só por vocês mesmos, mas pela igreja e pelas missões.

E com a imposição das mãos e com oração, num ambiente de reverência marcante, encaminhou-nos para o trabalho da igreja — o que me lembro como fosse agora.

Os sete servidores eleitos e ordenados pela igreja foram os irmãos Fritz Karps, Wilis Slengmanis, Jahnis Klawins, Evalds Feldbergs, Karlis Sebergs, Juris Frischembruders e Karlis Macths.

Os trabalhos da Igreja se desenvolviam muito bem, pois cada domingo que passava a igreja se revigorava e havia sinceros cultos de louvor e adoração. No aniversário de fundação da igreja (20/03) havia festas que duravam vários dias, seguidos com ricos e variados programas. Cantavam diversos coros, de senhoras, de visitantes; chegou-se a ter seis coros participantes.

A igreja, como reconhecimento e gratidão a seus obreiros, presenteou a todos eles com o desejado livro “A terra onde Jesus andara”. O pastos Inkis disse:

— Hoje não comemoramos o Natal, mas mesmo assim vamos distribuir presentes.

Os que receberam as lembranças foram o moderador da Igreja, irmão Fritz Karps; o dirigente do coro do Rio Novo, irmão Juris Frischembruder, que havia recentemente aposentado sua batuta; Karlis Matchs, que também tinha trabalhado como dirigente do coro do Rio Carlota (este era o mais idoso e por isso ganhou um Novo Testamento impresso em letras de tamanho grande); também foram lembrados os novos dirigentes dos coros, Wilis Leeknins e Gustavs Grikis, como estímulo para um diligente trabalho. A organização desta distribuição de lembranças com o intuito de reconhecimento foi organizada sigilosamente e desenrolou-se maravilhosamente, causando uma impressão inesquecível.

Na nossa memória estão guardadas muitas outras maravilhosas recordações, mas quando estamos a escrever devemos guardar limites.

Chegava o mês de abril de 1898; na Europa era início da primavera e aqui outono, época das colheitas. Faz agora quase um ano que o evangelista de Riga trabalha em nosso meio, e os nossos corações curtem os frutos de reconhecimento.

Em segredo absoluto a igreja organizou a festa dos balanços [?] no 14 de abril, que ainda estava em vigor segundo o antigo calendário da velha pátria (quarta-feira da semana santa). Ao redor da residência, junto à casa da família Grauzis onde [o pastor Inkis] se hospedava, foram se chegando na escuridão noturna, em passos silenciosos, grande parte dos habitantes da colônia.

Uma profunda paz noturna cobre toda paisagem. De repente luzes são acesas e um potente coral masculino irrompe com o hino: “Jeová, Jeová”, vibrando frente à porta da casa e ecoando pelo vale afora. Ao mesmo tempo mãos ágeis prendem e penduram arranjos florais e palmas nas portas e ao redor da residência do homenageado. Após este cântico ainda canta um coro misto. Então sai da sala aquele que foi acordado. Cumprimentos. Os cantores e os dirigentes da igreja entram na sala, enquanto os outros participantes silenciosamente se retiram para as suas casa para continuar o repouso. Na sala persiste um silêncio e uma expectativa, como que um estivesse esperando pelo outro ou que viria depois. O pastor Inkis tenta quebrar o silêncio contando um fato que acontecera em um culto “quaker” no qual reinava um silêncio como o daquele momento. Chegados e assentados aguardavam que surgisse uma palavra, mas ninguém parecia inspirado. Longo e interminável silêncio.

Então uma menina levanta-se, e na sua voz infantil teria dito:

— Pois eu acho que nós todos devíamos mais e mais amar o Senhor Jesus.

Foi como se tivessem sido abertas as comportas. Para muitos surgiram motivos para testemunhar do amor de Jesus, e também começou a desenrolar-se o nosso novelo com conversas e hinos. É aniversário, então também há presentes. F. Karps entrega ao obreiro, como presente, uma quantia em dinheiro. Após examinar ele diz:

— Realmente é um presente pesado.

Em seguida recebeu presentes de outras pessoas, depois mais hinos e palavras amáveis. Entre outras coisas, diz o pastor Inkis:

— Pois quando fui dormir ontem (era madrugada), estava sem sono e notei como os cães da colônia latiam mais do que em outras ocasiões. Agora entendo porque. Completei os 26 anos de idade e estou entrando para os 27, e o ano que tenho passado em Rio Novo posso contar entre os mais felizes da minha vida.

Já estava clareando o dia quando nos retiramos, os corações cheios de alegria.

Um belo dia o Sr. Staviarski, diretor da Empresa Colonizadora, enquanto atravessava a colônia de Rio Novo, parou em casa de colonos letos para descansar e tomar um café. Foi ali surpreendido por um grupo de crianças da colônia, orientadas pelo pastor Inkis, que o saudaram com um pequeno hino, “De todo nosso coração, nós saudamos tão caro hóspede, nossos olhos brilham, nossa alegria é real”, e em seguida “Ajuda-nos a cuidar dos pequenos.” Em seguida uma menina lhe entregou um livro de encadernação dourada — “A Terra em que Jesus andara”, em língua alemã, que ele conhecia perfeitamente. Seguiu-se a petição das crianças: que o senhor diretor tomasse as providências para doação de uma gleba de terra no meio da Colônia para que fosse possível ser construída uma escola para elas…

Durante este período houve diversos batismos, que foram festas de muita alegria tanto aqui na terra como no céu. O período de trabalho do pastor Inkis foi um santo tempo, pleno de alegria e crescimento espiritual. Não faltaram momentos de alegria e de descontração, mas também os de firmeza e determinação. Sempre ao lado da verdade e da justiça, ajudava os doentes com conselhos médicos e medicamentos, e sempre compartilhava com os sentimentos tantos os alegres como os de tristeza. Provocava um clima de boa vontade geral; por exemplo, a família Ochs veio ao encontro da necessidade da igreja hospedando o pastor por 6 meses e, em seguida, mais outros 6 meses foram passados na casa dos Grauzis nas mesmas condições.

Depois ter passado um ano em Rio Novo o pastor Inkis tomou o rumo do Rio Grande do Sul, a fim de visitar a colônia leta de Ijuí. No dia da despedida houve uma grande festa na casa dos Ochs, um verdadeiro banquete. O desenvolvimento espiritual, cultural e mesmo financeiro da colônia estava em seus e nossos futuros planos. Em vão ainda tentamos alcançar, mas foi inútil. Não haverá mais…

Depois que o pastor Inkis voltou a Riga nos visitaram em Rio Novo os irmãos missionários americanos do Rio de Janeiro, W.B. Bagby e o Dr. Donan, ambos pioneiros do trabalho batista naquela cidade [Nota de J. Inkis: De minha parte devo informar que as notícias sobre os batistas letos de Rio Novo e sua localização foram cedidos por mim a esses missionários americanos. Quando da minha volta para a Europa fiquei retido uma semana no Rio de Janeiro, capital da República. Ali consegui encontrar uma igreja batista, que em 1899 era ainda a única em toda cidade, e onde também encontrei o missionário que desta pequena igreja era o fundador e pastor. Como vimos, este não planejado atraso proporcionou um encontro que foi fundamental para despertar no missionário o desejo conhecer a igreja do Rio Novo].

O missionário Bagby pregava e cantava sinceramente e poderosamente. Donan falava mais devagar mas, como de profissão era médico, ajudava os doentes e necessitados. Ambos gostaram muito da colônia e adjacências e disseram que o pastor Inkis deveria voltar a este lugar e trabalhar no evangelismo [Nota de J. Inkis: Esta palavra amiga dos missionários se cumpre como profecia 20 anos depois em outra localidade e em outras circunstâncias. Não foi muita vantagem para a igreja de Rio Novo, a não ser o desenvolvimento da literatura evangélica em língua leta, agora mais abundante e de fácil aquisição por ser produzida aqui mesmo no país (Varpa, SP)].

Como inesperado hóspede numa manhã de domingo visitou a igreja de Rio Novo o pastor luterano e nos apresentou em língua alemã um sermão sobre o homem rico e o pobre Lázaro.

F I M

Juris Frischembruders

Texto de Juris Frischembruders com prefácio de Janis Inkis. Publicado na Revista “Kristigs Draugs” (O Amigo Cristão) números 09, 10 e 11 nos meses de setembro, outubro e novembro de 1940.

Leia também:
1. Breve História da Igreja Batista Leta do Rio Novo, primeira parte
2. Breve História da Igreja Batista Leta do Rio Novo, segunda parte

O filho do italiano que comprou a terra do Limor | Olga Purim a Reynaldo Purim

Rio Novo, 14 de agosto de 1919

Querido Reinold!!

Primeiramente receba muitas lembranças de todos de casa. Na semana passada recebemos as cartas do Arthur e da Luzija; se bem que não eram resposta a nenhuma carta, mesmo assim vou escrever para você.

Nós estamos passando suficiente bem. O tempo está fresco e bom, este ano não houve geadas por aqui. Só algumas pequenas nas baixadas. Este ano é bem provável que não haja mais geadas, pois está tudo verde, tudo florescendo, as laranjeiras brotando e todas as plantas cheias de abelhas que vão e vem com o zunido alegre e contínuo de uma primavera que chegou…

Tem muita gente derrubando capoeiras e matas para fazer coivaras onde serão feitas as novas plantações. Nós ainda temos milho para colher, e deverão ser gastos uns dois ou três dias neste serviço. O milho não deu muito bom, devido à seca quando estavam florescendo e depois as ventanias e temporais que derrubaram muito; mesmo as abóboras na Bukovina deram menos que nos outros anos. Todos falam que o milho deste ano não foi muito bom.

O açúcar nós já fizemos, como já escrevi na outra carta, e agora é época de plantar cana outra vez. Então trabalho é que não falta, pois o tempo das plantações chegou.

Você tem os seus trabalhos, mas não são os mesmos que os nossos. Onde vocês guardam a lenha que racham? Quem é o teu companheiro na serra para topiar a lenha? E o Fritz Janausks, tem alguma tarefa ou ele tem dinheiro suficiente para pagar a escola e não ter que trabalhar?

Os mensageiros que foram à Convenção, há 1 mês e ½, ainda não voltaram. Acho que eles estão aproveitando bem a oportunidade; uma vez que saíram, então por que não? Mas faz duas semanas que são esperados por aqui. Os navios não têm nenhuma regularidade, mas as vezes chegam e partem antes do dia marcado. Hoje está sendo esperada a mala postal e quem sabe também cheguem os viajantes. Eles foram, além de Kuritiba, também para Blumenau, então o Robert [Klavin] vai ter o que contar o ano inteiro. Pois esteve em lugares em que nunca tinha estado nem conhecido.

Desta vez não tenho quase nada de novo para escrever. É possível que eu logo receba resposta às minhas duas cartas, uma que mandei no dia 14 de junho e outra no dia 1 de agosto. Acho que você já as tenha lido.

Esta semana o filho do italiano que comprou a terra do Limor foi morar na choupana do Anton Netemberg, nos fundos da colônia deles. O Diretor da Empresa [de Colonização] começou dar uns apertos no Nepis [Netemberg], então toda aquele papo e grandeza foram água abaixo.

O Nepis tinha ido ao Diretor pedindo que ele desse uma autorização para que ele pudesse vender a propriedade, pois ele quer mudar para a serra, onde o trigo cresce maravilhoso e as vacas tem úberes nas costas e para tirar leite não se faz necessário se abaixar. Mas já tinha avisado que não ia dar leite para beber para todos. Somente para quem ele quisesse.

O Diretor não foi na conversa dele e avisou que uma vez quitada ele terá a liberação para vender para quem ele quiser. Mas como ele já tinha vendido a metade dos fundos, ele tem que se virar em 150$000, se não o italiano vai tomar tudo.

O Antônio e a Helena já estão morando junto dos velhos. O Jepis, um menino ladino, foi a cavalo até Mãe Luzia para se candidatar a genro do Akledames, pois ele queria a Lina, que tinha muita terra e muitas vacas, mas nada deu certo. Aí ele voltou para casa e recebeu novos conselhos do velho Gedus, para voltar a Mãe Luzia e fazer a mesma manobra com os Andermann, pois além da Pauline o velho tem muito dinheiro, e ele ficaria sensibilizado por um jovem de fora — mas lá recebeu também um “balaio” e todos os planos foram para o espaço.

Bem, por hoje chega. Noutra vez mais.

Com muitas e amáveis lembranças,

Olga

Os rapazes que deixam escapar alguma palavra em brasileiro | Olga a Purim a Reynaldo Purim

Rio Novo, 8 de junho de 1919

Querido Reinold!

Saúde! Hoje é a festa de Pentecostes [NOTA: Em leto “festa do verão”, a tradição lembrando ainda o hemisfério norte]. Está bastante quente, como fosse verão mesmo. Está um pouco nublado mas não vai chover.

As estradas estão todas ainda lamacentas das chuvas da semana passada, pois não foi pouca coisa não. Geada nenhuma até agora. Em outros anos nesta época não tinha mais nada verde.

Nós graças a Deus estamos todos bem e todos com saúde.

Na semana passada, dia 3 de junho, recebi a tua carta escrita no dia 22-5-19. Por ela muito obrigado. Estou muito alegre que todas as minhas cartas você recebeu regularmente. E do mesmo modo, as tuas cartas e os jornais estamos recebendo em perfeita ordem. Na semana passada, dia 7-6-19, mandei um pacote que pesou 1 quilo, contendo meias e as cartas de Luzija e Artur. É possível que as tenhas recebido e assim sabes que o período de festas aqui terminou.

O Deter esteve em Rio Novo e já foi embora. Aquelas três semanas, duas aqui e uma em Mãe Luzia, passaram muito rapidamente. Ele agora possivelmente esteja em Blumenau. Ele não aprova o exagero dos letos de Blumenau em relação aos Espíritos, [doutrina com] que eles estão totalmente envolvidos. Semanas atrás estiveram aqui o Anderman e o Strauss. Você se lembra do Augusto Strauss. O irmão dele está totalmente envolvido com esse movimento. Pois eles estiveram aqui uns dias, mas foram embora para Mãe Luzia. Aqui a “igreja” deles não vingou, pois os únicos que davam algum apoio que eram o velho Grikis e o Limors, e eles não se dão entre si.

Sobre as Festas não tenho muito o que contar. De Pedras Grandes veio uma irmã do Onofre Regis e a filha Rosa com o marido dela, e mais uma mulher que eu não conhecia. Eles ficaram hospedadas na casa do Willis Oschs, o qual providenciou cavalos para ir buscar estes visitantes e depois levou-os novamente até Orleans.

Quando o Deter estava aqui o Onofre, José e mais um parente deles esteve nos Klavin. Você pergunta se nossa Escola Dominical vai mandar representantes para a Conferência em Paranaguá. Já escrevi na carta passada que a Escola Dominical na casa dos Leimann foi interrompida com a reunificação das igrejas. Se alguém desse o dinheiro ou se eu tivesse de sobra eu bem que gostaria de ir, pois nunca fui a um evento destes.

Eu mostrei o anúncio da Convenção no Jornal para o Roberto [Klavin]. Ele não tinha visto, parece que ele não é muito chegado a leitura de jornais. Sugeri que ele partisse antes e fosse adiante visitar você. Ele vai embarcar em julho para Paranaguá e parece que não tem vontade ou coragem de ir adiante. O Deter prometeu voltar para o Rio Novo no Natal e voltar mais vezes visitar o Estado de Santa Catharina.

E você não vai vir para casa no Natal? Esta faltando meio ano, mas este passará muito rápido, pois o começo do ano parece que foi agora e já estamos no meio do ano. Quem sabe você já não saberá falar mais em leto e só em brasileiro, que segundo o Grünfeldt é língua de negros. Ele fica patrulhando os rapazes que às vezes deixam escapar alguma palavra em brasileiro.

Eu tive a chance de escutar duas pessoas falar em inglês pela primeira vez na vida. Eram o Deter e o Butler, que quando os dois estão sós falam somente em Inglês.

Eu fiquei mais duas semanas em Orleans na casa dos Stekert, mesmo sem aulas de costura, porque eles tinham um monte de problemas, como vender as vacas e os cavalos, que ainda estão à venda. Os porcos foram levados com o milho a Orleans, onde vão ser engordados.

No Rio Novo ninguém [da família Stekert] vai ficar morando. No próximo mês a propriedade vai ser arrendada a um italiano.

Os Pintados foram embora para o meu luga [em português no original] e a história não ficou bem contada. Eles fizeram dívidas com todos e até para nós ficaram devendo 2$700 — e muito mais para os outros. Eles foram embora de noite. Outros dizem que podem ser eles que tenham matado o Stekert, pois nos últimos tempos eles tinham raiva um do outro e o Jurgim deixou escapar que o genro dele era um verdadeiro bandido (?).

O dinheiro do Stekert até agora não foi encontrado e todo mundo sabe que devia existir.

Bem, por hoje chega. Outro dia novamente.

Lembranças do Papus, da Mamma e da

Olga

A Nova Sciencia de Curar | Roberto Klavin a Reynaldo Purim

Invernada, 6-5-19

Querido amigo!

Recebi a tua carta escrita no dia 1-4-19 no começo da semana passada, mas como não tinha nenhuma ida programada a Orleans a resposta atrasou. Você menciona que escreveu mais cartas, mas estas devem estar perdidas. Esta última estava com o envelope rasgado e precariamente colado, indicação clara de que há ladrões no sistema de correios.

Hoje até que enfim chegou o tão esperado A. B. Deter. Tinha avisado com telegrama mandado de Paranaguá, então amanhã a noite ele deve chegar ao Rio Novo. Ele vai ficar pouco tempo, mas deverá visitar a Igreja de Mãe Luzia. Quanto ao que acontecer, eu no momento não poderei escrever antes de voltar para casa. Estou trabalhando fora para um tafoneiro (melders) fazendo uma nova engrenagem para o moinho dele, e tratei também com um italiano para construir um novo engenho de farinha de mandioca, que logo terei que começar. Mais outro já me procurou para outro serviço que às vezes tenho de dispensar, pois em casa também temos muito serviço.

[NOTA de V. A. Purim: Roberto Klavim era um grande construtor de atafonas, serrarias e engenhos de farinha de mandioca; sempre tinha junto de si aprendizes, principalmente italianos.]

No começo do ano nossa igreja teve problemas e desavenças devido a coisas antigas que o Match vinha querendo levantar; o resultado foi que ele afastou-se da igreja, e agora as coisas se acalmaram. Ele sempre queria que as coisas acontecessem do jeito que ele pensava e como a maioria não foi na dele, ele se afastou. A Escola Dominical no Rodeio [do Assucar] durante o mês de janeiro parou devido à Milda, que pediu demissão, mas logo em seguida a igreja elegeu a Emma para professora e agora vai tudo bem em frente.

A Escola Dominical no Rio Larangeiras te envia muitas lembranças. A mulher do Caciano está muito adoentada e com a fisionomia decaída, e a Maria também está muito pálida. Muito ao contrário, a Margarida está vermelha como uma beterraba e continua aprendendo a ler e escrever.

Bem, quanto à saúde não há muito o que se queixar e ainda agora eu tenho dois livros sobre saúde em brasileiro. Um é “A Nova Sciencia de Curar”, que ganhei de presente do Dr. W. Butler, e ensina a curar as doenças. O outro encomendei de uma livraria de São Paulo; este ensina reconhecer as doenças pela fisionomia, pelo corpo e pelo rosto da pessoa. Com base nestas informações constatei que tenho problemas no fígado, mas eu vou curar com água [hidroterapia].

Obrigado pelas lembranças do F. Janaujakas: retribuas para mim.

Às vezes quando penso em estudar mergulho em profundas reflexões, mas chego à conclusão de que nas condições em que me encontro não teria a mínima possibilidade de superar e chegar ao ponto em que já estás. De qualquer modo acho que o alvo que buscas é nobre, que é trabalhar na causa de Deus. Mas quanto a mim, acho que não fui escolhido para este ministério.

O Arnolds [Klavin] está muito bem lá nas serras, e está bem mais gordo do que quando morava aqui em baixo. O Juris está lutando com a sua estimada cultura de algodão [em São Paulo]. Acho que a esta altura já deve tê-la colhido, mas não temos notícias dele.

Finalizando, receba muitas lembranças nossas e também minhas, e que Deus te ajude.

Roberto [Klavin]

Viagem a Tubarão | Olga Purim a Reynaldo Purim

Escripto em letto
[observação em português no original]

Rio Novo, 24 de outubro de 1918

Querido Reinold,

Recebi a tua carta, escrita no dia 3 de outubro em brasileiro em nome de E. Leimann, no dia 18 de outubro. Agradeço. Eu devia responder mais rápido, mas o tempo chuvoso e as estradas lamacentas não permitiram. Devido a isso a matança dos porcos gordos [também] não foi possível; como poderíamos transportar os mesmos para vender? Por isso não respondi, já que ninguém iria levá-la ao correio.

As tuas cartas também estão demorando. Recebemos os jornais e uma pequena cartinha e mais o Bolletin cor de rosa. A carta do Watson também foi recebida. E quanto à convocação e os regulamentos militares, não gostamos nada, principalmente quando [soubemos que] você poderá ser chamado. Aqui sobre estas coisas pouco se fala.

Quanto ao nosso bem-estar, graças a Deus estamos muito bem. Serviço é que temos bastante: temos que capinar e plantar, e quando a gente termina num lado, o mato já está nascendo do outro.

Agora faz um mês que está quente, chuvoso e úmido que até parece janeiro ou fevereiro. São chuvas de trovoadas, mas temos medo que venha algum período de seca. Milho já plantamos cinco quartas, perto da roça da ponte; na roça atrás do mato plantamos arroz, mandioca, aipim grande, batata inglesa e amendoim.

Quanto às coivaras, ninguém consegue “fumegar”, pois estão ficando verdes e bonitas outra vez e quase não se distingue o que é uma coivara de mato por aí. Este ano tivemos visitas da Argentina [gafanhotos]; aqui em nosso terreno poucos tem aparecido, mas lá nos Klavin e nos Leimann passaram imensas nuvens. Por sorte não desceram, foram pousar bem longe na terra dos italianos, onde estão pondo ovos.

Aproveitando, enquanto me lembro, o Arthur Leimann manda muitas lembranças para você e para os seus colegas.

Agora vou escrever alguma coisa de novo: nossa viagem a Tubarão.

Tu tens viajado de trem muitas vezes, agora eu, desta vez foi a primeira — mas “quem toma gosto por viagens voltará a viajar”. Aqui o governo ofereceu passagem para as pessoas que quisessem votar para intendente; teriam que ir a Tubarão preparar uns papéis [de qualificação eleitoral], pois naquela primeira eleição não deu nada e por isso estavam procurando novos eleitores — dando passagem gratuita, refeições, pagamento do hotel, e tudo faziam para que fossem até lá. Mas havia uma condição: só podia votar quem tinha propriedade. Então Papai foi e aproveitei para ir junto, mas não comece a pensar que fui para votar também.

Nós pensávamos de aproveitar a viagem para lá comprar alguma coisa mais barato, mas não encontramos nada mais barato que em Orleans. Para não dizer que nada era mais barato, tinha o café, que em Orleans era 2$000 o quilo e lá era 1$500.

Nossa viagem foi no dia 26 de setembro. Fomos a pé na véspera até Orleans; eu pernoitei na casa dos Stekert e Papai foi para a casa do João Feldmann. Naquela viagem éramos seis letos: os Leimanns, o Arnoldo Klavin e o Willis Elbert. Pela manhã o tempo estava magnífico, mas mais tarde começou a ficar nublado e a soprar um vento frio e terminou ficando um dia até bem escuro.

Em Tubarão nada de bonito cheguei a ver, e sim estava cheia daqueles árabes velhacos. Comprar em Orleans é muito mais tranqüilo, pois os donos das vendas são todos conhecidos e são muito mais confiáveis.

À noite estávamos de volta e a Luzija foi me buscar com a “Marsa”. Papai não voltou naquele dia; a noite estava por demais escura e depois ainda começou a chuviscar. Voltamos todos montados de Orleans: eu a Luzija, os Klavin e os Leimann. Chegamos bem em casa, apesar da negra escuridão, que podia até furar os olhos. Ainda não sabemos quem será o novo intendente.

No dia 15 faleceu o velho Wilmans e no dia 16 foi feito o funeral. Ele toda vida morou em Mãe Luzia, mas quando doente, sem mais poder se cuidar e nada mais poder fazer, voltou a morar com a mulher em Rio Novo.

Na noite de 16 de outubro teve a festa de aniversário da União de Mocidade da Igreja de Rio Novo. Como foi a festa eu não sei, as estradas estavam lamacentas, tanto que quando as pessoas passavam fazia barulho. Foi servido café com mistura e isso custou $300 por pessoa.

No dia 9 de outubro foi a festa do Jubileu de 25 anos da Igreja Batista de Mãe Luzia e para tanto foi convidada a nossa igreja e também a do Rio Novo. Da nossa igreja foram o Robert Klavin e do Rio Novo uns quatro. Como foi o Jubileu não sei ao certo, mas é possível que o Roberto te escreva contando.

Na quarta feira passada, dia 24 de outubro, foi o casamento do Jahnis Frischembruder com a Laura Seeberg. O casamento foi memorável, como bem merece uma filha única. Mas a Laura “não tinha alimentado o cachorro nem o gato”: o tempo já estava chuvoso, mas nem no dia anterior nem no dia depois choveu tanto como naquele dia. Deste a alta manhã roncava trovoada, relampejava e caía água.

Todos os moradores da localidade foram convidados, menos nós. De Orleans foi convidada a banda de música, bem como outras pessoas importantes que não vieram ou não puderam vir. A solenidade na igreja foi às 12 horas, e depois todo cortejo subiu o morro em direção a casa dos Seeberg. Lá houve a maior comilança e beberança da paróquia, e não sei quantos centos foram gastos na festa do casamento, pois tudo devia brilhar e reluzir. Além disso, em toda a colônia nenhuma moça teve um enxoval tão completo e tão grande como o dela — teriam sido gastos milhares de réis.

Tempos atrás o Victor Karklin esteve interessado em se candidatar a “genro”, mas não se apressou o suficiente e o outro passou ele para trás. E por isso também não foi à festa. Os Karklin teriam dito que se soubessem de tanta riqueza no dote, teriam se apressado mais; também eles só procuram as riquezas e estas não são muitas.

A segunda festa do casamento foi no domingo na casa nova, defronte aos Frischembruder, recém-construída no outro lado rio, onde era a antiga colônia dos Match. Esta casa foi construída de tijolos e seria a melhor de toda colônia, especial para o Jahnis.

Há pouco tempo houve noivado da Ana Burmeister com o Alfredo Leepkaln. Quem não gostou foi a senhora Wilman, pois parece que queria o moço para a seu genro e viu a sua filha ser preterida. A “distinta” pôs a boca no trombone e depois chegou a conclusão que não perdeu tanto, pois esse moço Leepkaln não é muito afeito ao trabalho.

Pode ser que em breve o Arnold Karklin e o Augusto Felberg viajem para São Paulo. O Jurka tem escrito que lá em Nova Odessa que qualquer um ganha 2$000 por dia e assim eles também iriam para Leijputriju [NOTA: Pronuncia-se “Leiputriu” e é um lugar fabuloso e imaginário onde mana o leite e o mel, equivalente a Shangrilá ou El Dorado]. O Matiss, que também está lá, escreve que lá tudo é caro. O que adianta ser tudo tão caro, se nada se tem para vender?

Bem hoje chega, outra vez escrevo mais. Muitas lembranças de todos. Fico aguardando longa carta sua.

Olga

PS [Escrito à lápis]. Junto estou enviando 100$000. Recebemos a carta escrita em 7 de outubro e também os jornais. Se puderes venha para casa, mas se tem lugar onde ficar decida você mesmo o que quer. Orleans, 01 de novembro de 1918.